Falsas conquistas brasileiras em 2013

Por Roberto Dias Duarte

O último relatório Doing Business põe o Brasil na 159ª posição, mas ainda ocupando o posto de país com a maior burocracia fiscal do mundo, mesmo obtendo uma colocação pouco melhor frente à lista anterior. Comemorada pelo governo federal, a “façanha” descortinou mais uma obra de ficção criada no afã de se obterem números favoráveis. Celebrar ilusões, afinal, sempre esteve entranhado no jogo político nacional.

A “melhora” do Brasil no ranking se deu por causa da ampla reforma da Lei de Falências, realizada em 2005, associada à redução de 22% no custo do endividamento, bem como a um aumento de 39% no nível agregado de crédito. Porém, o Time to Comply, índice que mensura quantas horas por ano são necessárias para preparar, registrar e pagar impostos e contribuições, e que compõe o critério de Paying Taxes, permanece em 2.600 horas desde 2003.

Este indicador usa uma “empresa-modelo” como estudo de caso para medir custos tributários e trabalhistas e como eles afetam os resultados das companhias. Na prática, não se pode afirmar que as empresas brasileiras gastem, em média, 2.600 horas por ano para calcular e pagar impostos.

Por usar um padrão estabelecido por essa empresa-modelo, o estudo serve como parâmetro comparativo entre os 185 participantes do ranking. Por isso, estatisticamente pode-se afirmar que amargamos o maior custo de conformidade fiscal e trabalhista do mundo, nove vezes superior à média mundial.

A posição exageradamente comemorada se deve à piora de um país que estava à frente, e não propriamente à melhora do Brasil. Ora, até os mais incautos sabem que desenvolvimento de verdade se dá com educação, saúde, habitação, emprego, cultura, lazer e incentivo ao empreendedorismo.

Embora o relatório mostre que o Brasil subiu duas posições – da 121ª para a 123ª – no tempo gasto para se iniciar um negócio, este dado também é ilusório. Ao mesmo tempo, o estudo reforça nosso eterno problema em obter crédito, pois o país caiu da 105ª para a 109ª colocação nesse quesito.

Outro dado interessante está na recente pesquisa da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, feita em conjunto com o Banco Mundial e a Universidade College London. Mães que mantêm as crianças em creches conseguem elevar a renda familiar de 20% a 25%. Como faltam vagas, o mercado de trabalho deixa de absorver 3,9 milhões de trabalhadoras.

Em novembro último, provavelmente embalada por este cenário, a presidente Dilma Rousseff fez uma declaração, durante a abertura do XIV Congresso da Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo, em Campinas, que me causou certa inquietação. Disse ela: “Não podemos informatizar a burocracia, temos de facilitar, porque a burocracia provoca custos e desperdícios”.

Como fazer isso, visto que praticamente todas as iniciativas do governo, inclusive o SPED, se resumem a informatizar a burocracia? Ou seja, automatizar aquilo que não precisa ser feito!

Nossa burocracia surreal, além do óbvio custo que todos nós pagamos ao consumir produtos e serviços, cria outro efeito perverso: uma “reserva de mercado” que dificulta a concorrência e cria uma lacuna de atendimento e produtividade.

Recentemente, várias companhias globais anunciaram não pretender expandir seus negócios no Brasil, dadas as barreiras burocráticas. Na prática, sofremos todos por causa da pouca concorrência. Enfim, pagamos mais e recebemos menos.

Há efeitos ainda piores: corrupção endêmica e venda de favores, desvios de conduta beneficiados pelacomplexidade do sistema. Só teremos uma verdadeira transparência na arrecadação e na aplicação dos recursos quando as regras forem claras o bastante para que cidadãos comuns possam entendê-las.

Implantado gradualmente desde 2007, o Sistema Público de Escrituração Digital (SPED) é uma ferramenta que poderá ajudar a melhorar esta situação. A partir deste ano, por exemplo, passará a operar com o eSocial, seu mais complexo e ambicioso subprojeto, e unificará o envio ao governo de informações previdenciárias, trabalhistas e fiscais. Haverá menos brechas para burlar a lei. Contudo, sem uma grande redução da complexidade regulatória, o SPED é tão útil à sociedade quanto uma moderna embarcação no rio Tietê.

Não é à toa que nosso crescimento econômico míngua a cada trimestre –expansão de apenas 1,5% no primeiro; 0,6% no segundo; menos 0,12% no terceiro. Sem as reformas tributária, previdenciária e trabalhista, certamente veremos novos índices nestes patamares, comprovando, na prática, que “pacotes de bondade” só existem para “brasileiro ver”. De outra forma, ficaremos apenas aguardando qual será o próximo mensalão, mensalinho, financiamento ilícito de campanha ou quadrilha de auditores fiscais.

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Comentários

  • Caro Roberto.

    O Brasil é mesmo uma Noruega às avessas. A "doutora presidenta" Dilma diz que não se pode informatizar a burocracia, assim, ou ela disse isso apenas por dizer ou seus súditos próximos não lhe dão ouvidos ou, ainda, ela não sabe o que seja burocracia.
    Como bem observou, "o SPED é tão útil à sociedade quanto uma moderna embarcação no rio Tietê", mas é pior ainda, pois, tem alto custo para comportar a desmedida complexidade tributária brasileira tendo como contrapartida as dificuldades do contribuinte (tecnologia, conhecimento e dinheiro) considerando que se aplica desde às empresas de grande porte quanto aos produtores rurais pessoas físicas e, por certo, será uma grande fonte de renda oriunda de multas no futuro quando se começar a juntar as informações prestadas por esses canais (SPED).

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