Reforma política é prioridade, afirma Chapina

SÃO PAULO - A defesa da reforma política deve ser a bandeira principal dos empresários no debate para a escolha dos próximos representantes nas eleições majoritárias que acontecem este ano, afirma José Maria Chapina Alcazar, empresário do setor contábil e presidente do Sindicato das Empresas de Contabilidade (Sescon) e da Associação das Empresas de Serviços Contábeis do Estado de São Paulo (Aescon). O empresário acredita que só depois da reforma política será possível chegar à reforma tributária e à desburocratização do sistema contábil defendidas por essas entidades. O empresário também está em campanha, ao lado da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), para a impedir a aprovação dos projetos de lei que pretendem conferir aos procuradores da Receita Federal novas atribuições para penhorar bens antes do ajuizamento da execução fiscal, sem necessidade de autorização judicial. Essas e outras questões a respeito da participação do setor empresarial nas ações do governo estão na entrevista desta semana do programa "Panorama do Brasil", uma parceria do DCI com a emissora TVB e com a rádio Nova Brasil FM. Apresentado pelo jornalista Roberto Müller, o programa contou com a participação de Milton Paes, da Nova Brasil FM, e de Márcia Raposo, diretora de Redação do jornal DCI. Roberto Müller: Quando vemos autoridades e parlamentares discutirem um ato -com chance de ser aprovado- que cria um novo poder no Brasil que transforma o agente fiscal em um sujeito mais poderoso que o presidente da República, o que isso significa para o País? José Maria Chapina Alcazar: Estamos vivendo uma total inversão de valores, pois, se não ficarmos atentos -e a imprensa tem contribuído com seus alertas-, nessa inversão o Estado pode tudo, ou pretende obter poder para tudo, e o contribuinte perde direitos. Nós estamos vivendo leis que estão sendo formatadas a pedido dos poderes executivos, sempre com a conotação de que o empreendedor brasileiro é desonesto até que prove o contrário. Se for observado o contexto da lei, o teor da legislação e o principio punitivo, para identificar uma fraude, ou uma sonegação, o contribuinte brasileiro ficará muito fragilizado. Isso não significa que estamos defendendo a irregularidade, ou a informalidade, ou o sonegador, pois ele deve ser combatido com toda a força da lei, mas que a justiça deve ser preservada e garantida. Nós temos um projeto de lei que está na Câmara dos Deputados, a Lei de Execuções Fiscais, mas aqui no Estado de São Paulo tem uma lei que já foi aprovada pela Assembleia Legislativa que dá esses poderes ao fiscal do Estado de São Paulo. Inclusive houve longos debates a respeito da regulamentação dessa lei no Codecon, que é o Conselho de Defesa do Contribuinte, porque o fiscal pode tudo, tem o poder do juiz, ou melhor, ele interpreta, julga e aplica a pena, e somente depois a empresa pode procurar um advogado para provar que a resolução por ele aplicada não está correta. Tanto que sempre falamos que esse excesso de poder traz um risco muito grande, porque a empresa brasileira hoje já está prejudicada em todos os termos de competitividade. Qual é o incentivo que o empresário brasileiro tem para se motivar e criar o seu negócio? Ele tem uma dificuldade muito grande de abrir a sua empresa, uma carga tributária violenta, obrigações acessórias que complicam a vida do empreendedor, e leis que vêm sendo reguladas desta forma. Por isso, ressalto que esse excesso de poder pode trazer, à máquina que o exerce, um desvio de conduta. Se nós temos empresários que têm desvio de conduta, nós também temos servidores públicos que têm esse desvio; não pode haver esse excesso de poder. Temos de ter um equilíbrio nas relações entre justiça e o direito de buscar. A sua defesa não pode ser comprometida porque a lei que está no Senado Federal inverteu os valores. Por exemplo, o agente fiscal executa, o Estado penhora, coloca em leilão os bens, o leilão acontece, arrematam o bem por um valor de avaliação e somente aí o empresário poderá discutir esse direito na justiça. Mas nesse momento ele já perdeu o seu patrimônio; passam-se dez anos, é provado na justiça que ele nada devia, mas o seu patrimônio já foi embora, e o governo vota e diz o seguinte: 'eu vou te pagar daqui a dez anos com um precatório', e fim. Por isso as entidades estão atentas. O Fórum Permanente do Empreendedorismo, que trabalhou no caso da 232, na extinção da CPMF, tem uma contribuição muito grande de juristas que vêm alertando. E o empresariado tem de se unir, para não viver isoladamente, não olhar mais para o seu negócio com o foco de sobrevivência com alguma pequena sobra de informalidade, é preciso se profissionalizar. Márcia Raposo: Hoje os empresários brasileiros têm dificuldade de se articular para pegar a lei antes que ela passe a vigorar. Por que essa dificuldade permanece, mesmo com anos e anos de história do Brasil? José Maria Chapina Alcazar: Nós estamos passando por uma transformação cultural: temos 60% das pequenas e médias empresas brasileiras atuando no campo da informalidade, ou melhor, elas operam legalmente, mas existe uma grande probabilidade de haver informalidade. Com isso, surgiram nota fiscal eletrônica [NF-e], substituição tributária, serviço público de escrituração digital [Sped] e serviço público de escrituração fiscal. Os empresários estavam em uma zona de conforto muito grande, pois, se estavam levando vantagem, estava bom, eles não se preocuparam com a lei que estava no Congresso e que seria contra, pois teriam outros caminhos para a solução. Afinal, por que seguir uma orientação correta e cumprir todos os tributos e obrigações se existe gente que vende facilidades? Este tipo de conduta está acabando, os empresários começarão a se profissionalizar e se unir para acompanhar a legislação ao seu nascimento, antes de ela se tornar lei, porque a consciência está começando. Até há pouco tempo não havia o despertar do interesse por conta dos modos operantes; então a legislação veio com uma força muito grande. E temos de aplaudir o governo, nós somos favoráveis e contribuímos para que isso acontecesse. Mas é preciso ter cuidado com o excesso de rigor e com o equilíbrio da balança. Nós temos de esperar que o governo aplique esse rigor na sua administração pública. A sociedade está cansada de ver escândalos e dinheiro na meia e em outros lugares transformar-se em pizza e não retornar o valor do tributo em serviços à sociedade. Milton Paes: Sabemos que algumas questões polêmicas são aprovadas no Congresso no apagar das luzes. Não é importante que haja uma mobilização empresarial para coibir esse tipo de conduta? José Maria Chapina Alcazar: Com certeza é, e nós estamos vivendo um momento oportuno, pois estamos na época das eleições, iremos eleger o futuro presidente e os futuros governadores, deputados federais e senadores. As leis são aprovadas na calada da noite, sem o debate público, porque existe uma fragilidade dentro da nossa estrutura política. Esse sistema político precisa ser criado novamente, e necessitamos urgentemente de uma reforma política, porque tudo se resolve por acordos de lideranças. Os representantes do governo, colocados lá pelo povo, têm de defender os direitos do povo. Aqui, na Assembleia Legislativa, nós temos as frentes parlamentares em defesa da micro e pequena empresa fazendo discursos maravilhosos. Por que deixaram aprovar essa lei em dezembro, com todas essas punições ao empreendedor? Porque existe o acordo de lideranças, pois não é realizado um debate, e sim meia dúzia de pessoas definem o futuro de uma sociedade; o sistema político precisa ser repensado. Ou, também, na hora de votar, as pessoas escolham pessoas certas, que retribuam a confiança que nelas foi depositada. Roberto Müller: É sabido que nos parâmetros essenciais da democracia existe o direito do contraditório, a presunção da inocência. Agora o agente fiscal vai à empresa, e, estando certo ou errado ele encontra algo irregular, e com isso ele retém os bens e o empresário terá de discutir na Justiça durante anos para tentar reaver o que é seu por direito. Isso não é um perigoso precedente aos princípios democráticos? José Maria Chapina Alcazar: Com certeza, esta é a razão pela qual nós estamos juntos com todas a autoridades deste país em defesa da liberdade: a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), a Associação Comercial, o Sescon e todas as entidades do setor produtivo já se posicionaram a respeito; levamos até um parecer de inconstitucionalidade e o entregamos ao presidente da Câmara, Michel Temer, assinado por sete constitucionalistas, liderados pelo Ives Gandra, seguido pelo presidente da OAB, exatamente nessa tônica, não permitindo, evitando, que isso vá adiante, pois isso é o claro excesso de poder e o autoritarismo em comprometimento à garantia de democracia. Milton Paes: Vimos que aconteceram algumas pequenas reformas dentro do Judiciário, e eu acredito que o Judiciário não gosta dessa questão de que fiscais tenham mais poder do que um juiz. Como fica essa questão? José Maria Chapina Alcazar: Não há aprovação daqueles que defendem a democracia e o direito de defesa na justiça. Os juízes são contra essa legislação. É que, lamentavelmente, quando se fala de um pacto da República, e isso foi feito dentro de um pacto que foi constituído pelos três Poderes, alguém que representa o Judiciário provavelmente defendeu essa tese. Mas está sendo contrariada pelos representantes da lei, que são os advogados, a Ordem dos Advogados do Brasil, em uma ampla defesa. E não passará se nós estivermos atentos e vigilantes. Acho que o Brasil ainda goza de uma segurança jurídica, por mais que haja tentativas de quebrar esse princípio. E aí fica o alerta para que programas como este, matérias jornalísticas e o trabalho da imprensa passem a focar nesse ponto para formar a opinião da sociedade. Infelizmente, essas informações, poucos chegam a entender, porque nossa população, em grande parte, não está preparada para discutir esses assuntos. Márcia Raposo: Por esse raciocínio, a prioridade dos empresários nessas eleições majoritárias é obter um compromisso de reforma política? José Maria Chapina Alcazar: É o que nós pensamos. Eu digo nós porque estamos liderando todos esses projetos junto com todas as entidades que eu já citei, nós não temos alternativa. Nós conseguimos, por exemplo, uma reforma trabalhista. Temos uma legislação tributária complexa, burocrática. Já me disseram, "poxa, Chapina, você representa os contadores e parece que eles ganham dinheiro com essa burocracia". Eu digo: não, é um engano, esses profissionais que são militantes dessa burocracia irão desaparecer do mercado com o avanço tecnológico. O contador está sendo puxado pelo governo. O contador tem uma função estratégica, de atuar no planejamento, de forma preventiva. Então a reforma política é primordial porque, como nós vamos fazer uma reforma tributária e ela não saiu ao que se propunha, não saiu porque o governo de um estado foi contrário. Então, se um estado não concordar com as mudanças, ela não anda. A política é que precisa ser reformulada com um plano de governo, um plano de ação de primeiro mundo. Márcia Raposo: A Constituição de 1988 saiu do papel depois de um lobby empresarial liderado por Jorge Gerdau, que negociou os pontos primordiais. Não há governante que sobreviva ao poder econômico hoje em dia. O senhor acredita nisso? José Maria Chapina Alcazar: Acredito. O Gerdau tem declarado que o Brasil e as empresas que ele administra aqui, para atender todas as exigências do estado, precisa de 150 pessoas. A mesma empresa, em qualquer outro lugar do mundo, precisa de meia dúzia de pessoas. O que nós precisamos é trabalhar com todos os políticos e quebrar esse sistema de tomada de decisão por acordo de lideranças. Milton Paes: Até que ponto realmente interessa para a classe política brasileira uma mudança do processo político? José Maria Chapina Alcazar: Os políticos não querem, depende da sociedade. Vamos então inverter os papéis. O governo somos nós, pois pagamos os impostos e estamos omissos. Eu acho que a mudança está por vir. O Brasil passou a discutir uma regulação de um projeto eleitoral que criou uma tal de Ficha Limpa. Um país ético, moral, precisa regular isso? Roberto Müller: Toda vez em que se fala da necessidade de fazer uma reforma política, tributária e trabalhista, os candidatos em campanha o defendem, há um consenso sobre isso. Quando chegam ao governo, fica tudo mais ou menos como estava antes. Na sua experiência com a política, o que é preciso para acabar com esse círculo vicioso? José Maria Chapina Alcazar: Acho que estamos muito perto disso. A consciência da sociedade está vindo pela união, e tem um fator importante nesse processo que é o sistema tributário brasileiro. Ele permitia certas iniciativas para não se pagar o tributo. Todo cidadão brasileiro não tem mais como deixar de contribuir com as suas obrigações. Isto faz com que a união aconteça. É um processo lento, de dois, quatro anos, mas ele virá. No Brasil, a sociedade é pacífica a tudo. Em outros países, qualquer aumento de 1% da carga tributária causa uma verdadeira parada da sociedade. Aqueles que estão lá estão nos representando porque nós demos uma procuração para eles defenderem os interesses da sociedade. E nós é que pagamos os impostos, nós é que contribuímos. Milton Paes: O governo também não tem um lobby muito forte, por ter o poder nas mãos e poder desenvolver uma campanha para barrar aquela organização que está sendo formada? José Maria Chapina Alcazar: Já parei para pensar, e já tivemos vivências reais nesse aspecto. Vamos só relembrar a operação Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira (CPMF). O quanto o governo jogou e usou do seu poder para que ela tivesse a sua prorrogação. E perdeu pela mobilização da sociedade. Esse é o caminho. Só que ainda estamos em um processo muito lento. Esperamos a lei chegar a ser votada para depois reclamar dela. Vamos ter de tratar disso antes, quando começar a proposta. Então, já sabemos o caminho. A 232 também, todo mundo esqueceu, era uma legislação que vinha com alto poder de aumentar a carga tributária do setor de serviços e o governo perdeu. Perdeu pela mobilização, pela união. Esse é o caminho, mas precisamos de ações mais frequentes. E estamos dando exemplo disso. A Lei de Execuções Fiscais, por exemplo, não está tendo êxito. O plano de direitos econômicos não está tendo êxito como o governo pretendia, porque existe uma articulação de mobilização. Não está aparecendo com tanta ênfase, mas está interferindo no poder. http://www.dci.com.br/noticia.asp?id_editoria=7&id_noticia=335686&editoria=
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