Artigo de Daniel Grimaldi, Flavio L. Carneiro, Lucas F. Vasconcelos* Em maio de 2010, o Ministério da Fazenda anunciou um conjunto de medidas de incentivo à competitividade das exportações brasileiras. Enquanto o ministro Guido Mantega classificou o pacote como "tudo de bom", a reação do setor empresarial foi menos entusiasmada. Duas das medidas divulgadas (a aceleração da devolução dos créditos tributários e a implementação do "drawback" isenção para o mercado interno) estão diretamente ligadas a um mesmo problema: a incapacidade de o sistema tributário brasileiro desonerar os produtos exportados dos impostos indiretos - tais como Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), Programa de Integração Social/Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/Pasep), Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e Impostos sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Ainda que o último elo da cadeia - a exportação em si - não seja tributada, os impostos embutidos nas matérias-primas adquiridas pelo exportador acabam por impactar o custo do seu produto. Isso ocorre porque quando uma firma compra insumos, ela passa a ter direito a créditos tributários em valor correspondente aos impostos indiretos contidos nesta compra. Ao vender seu produto final, esses créditos podem ser utilizados para abater parte do imposto por ela devido. Dessa forma, a firma só recolherá os impostos correspondentes ao valor por ela adicionado - em respeito ao princípio da não cumulatividade. Contudo, nas vendas ao exterior não é possível compensar créditos gerados na aquisição dos insumos, uma vez que as exportações não são tributadas. Ou seja, a empresa só consegue utilizar os créditos quando realiza vendas no mercado doméstico. De acordo com estimativas da Federação de Indústria do Estado de São Paulo (Fiesp), empresas que vendem mais de 42,5% de sua produção para o mercado externo já enfrentam desvantagens em suas operações. Elas acumulam créditos tributários em montante superior à sua margem de ressarcimento e, com isso, precisam repassar o custo dos impostos para o preço final do produto no mercado internacional. Dessa forma, mesmo não havendo tributação nas exportações, o custo dos tributos embutidos no valor dos insumos utilizados segue onerando as mercadorias vendidas. Isso ocorre por conta do custo financeiro associado ao prazo decorrido entre a aquisição do insumo e a compensação de créditos tributários (uma espécie de "custo de carregamento"), caso a empresa realize vendas no mercado interno em montante suficiente. Contudo, esse é o melhor cenário. No pior, quando a empresa não consegue a compensação e precisa requerer a restituição dos créditos, o prazo de carregamento pode se estender até 5 anos, elevando consideravelmente o custo financeiro. A primeira das medidas de estímulo às exportações que compõem o pacote consiste na devolução, em até 30 dias após a solicitação, de 50% dos créditos de PIS/Pasep, Cofins e IPI acumulados na exportação. Talvez por ser a mais esperada, foi ela que recebeu mais críticas por parte do empresariado brasileiro. As reclamações se concentraram basicamente sobre a rigidez dos condicionantes exigidos, que diminuiria substancialmente o alcance da medida. Para tentar identificar o alcance real da medida, foram cruzados os dados da Pesquisa Industrial Anual do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (PIA/IBGE) e do Sistema Integrado de Comércio Exterior (Siscomex). É possível notar que, caso já estivesse valendo entre 2002 e 2007, a medida beneficiaria apenas cerca de 5,5% das firmas exportadoras. Ou seja, apesar de representar um avanço, a nova medida dificilmente será capaz de desonerar as exportações de todas as firmas atualmente prejudicadas pela malha tributária. Outra medida, a extensão da modalidade isenção para o mercado interno é mais uma tentativa de ampliar o alcance do regime de "drawback". Não obstante, além de tal modalidade representar só cerca de 10% da utilização total do regime de "drawback" e não possuir sistema informatizado para sua concessão, sua efetividade é limitada, uma vez que o ICMS não é alcançado pela desoneração tributária concedida. O Convênio ICMS 27/1990, firmado no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), prevê a isenção de ICMS apenas para as importações realizadas sob a modalidade suspensão do "drawback". Por conta disso, o insumo importado tem isenção de ICMS, dispensando-se o uso de recursos do fluxo de caixa do exportador para o seu pagamento. Já sobre o insumo adquirido no mercado interno incidirá o imposto, e o valor pago será revertido em créditos a serem abatidos em outros tributos ou acumulados. Assim, a compra de insumos no mercado doméstico implica o carregamento de créditos tributários por um longo período de tempo - acarretando em custo financeiro para o exportador -, enquanto a importação do insumo não. Estimações simples mostram que, no pior cenário (capital de giro financiado a 3,12% ao mês e 712 dias de carregamento), o custo financeiro pode superar o valor do próprio crédito a receber, gerando um diferencial de custo de quase 20% em favor das importações de insumos. Em outras palavras, a legislação tributária brasileira gera uma absurda inversão do princípio do tratamento nacional adotado pela Organização Mundial do Comércio (OMC): faz com que o insumo importado goze de condições mais favoráveis que o nacional. O recente pacote anunciado pelo governo tem o mérito de encarar o desafio de promover a competitividade das exportações brasileiras. Em um momento em que as vendas externas brasileiras sofrem com crescente concorrência internacional, esse movimento precisará se intensificar ao longo dos próximos anos. Contudo, ainda que represente um avanço (ou um "alento") em outros aspectos do comércio exterior, as novas medidas se mostram insuficiente para lidar com velhos problemas decorrentes da complexidade da estrutura tributária nacional, na qual o ICMS ocupa um papel de destaque. Dentro desse contexto, um pacto federativo capaz de promover uma reforma tributária torna-se absolutamente crucial para que o desafio de promover a competitividade das exportações brasileiras seja bem-sucedido. As eleições presidenciais surgem como um momento absolutamente propício para este debate. Falta apenas que os candidatos se engajem verdadeiramente no assunto - que, até agora, tem merecido pouca atenção. *Daniel Grimaldi, Flavio Lyrio Carneiro eLucas Ferraz Vasconcelos são técnicos em Planejamento e Pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Fonte: Valor Econômico / por Fenacon http://contabilidadenatv.blogspot.com/2010/09/os-incentivos-as-exportacoes-e.html
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