Câmbio diminui dívidas e melhora balanços de SAs

Se a queda do dólar tem efeito negativo sobre a receita das empresas exportadoras e reduz a competitividade de parte da indústria local diante dos concorrentes estrangeiros no mercado interno, o outro lado da moeda é o impacto positivo que a valorização do real tem sobre a dívida bruta de muitas companhias.

Entre o fim de junho e o de setembro, o dólar recuou 6,2% ante o real, em comparação com uma leve alta de 1,3% verificada no segundo trimestre. A moeda estrangeira ficou no menor patamar em dois anos, motivando medidas do governo para conter o avanço do real.

A redução do valor da dívida aparece diretamente no resultado financeiro e no lucro líquido das empresas, que é usado como base para o pagamento de dividendos aos acionistas. Esse efeito benéfico da alta do real na dívida pode ser significativo em empresas de papel e celulose, petróleo, siderúrgicas, frigoríficos e aviação, por exemplo.

Nesses setores, Petrobras, Vale, Fibria, Suzano, Klabin, Braskem, Usiminas, Gerdau, CSN, JBS, Brasil Foods, Marfrig, Minerva, TAM e Gol, num cálculo que não abrange todas as empresas, têm dívida bruta indexada ao dólar de R$ 172 bilhões. Uma variação de 6,2% sobre isso significa um ganho de R$ 10,6 bilhões.

A queda do valor contábil em reais das dívidas em moeda estrangeira não gera, porém, caixa nem afeta as margens operacionais. E o impacto final no resultado líquido varia caso a caso, já que algumas empresas também possuem ativos relevantes no exterior, que podem compensar a queda na dívida.

Há que se notar que nem todas as exportadoras sofrem com o dólar mais barato. "O câmbio está abaixo do patamar esperado, mas os preços elevados acabam compensando (o impacto nas receitas com exportação)", diz João Elek, diretor financeiro e de relações com investidores da Fibria. "Assim, o trimestre não antecipou surpresas." Produtora de celulose branqueada de eucalipto, a Fibria tinha em junho dívida bruta de R$ 13,2 bilhões, sendo 71% em dólar.

A Vale é outra que, em razão da alta do preço do minério, deve neutralizar a influência ruim do câmbio na receita, que é quase 100% em dólar. Para o analista Pedro Galdi, da SLW Corretora, a mineradora deve ter um lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (lajida) recorde, de R$ 12 bilhões no terceiro trimestre, diante da forte demanda chinesa e dos preços maiores. O efeito do dólar na dívida deve garantir também um resultado financeiro melhor, o que deve ajudar o lucro líquido a também ser recorde, na faixa de R$ 8 bilhões, na avaliação dele.

Do lado negativo, as siderúrgicas, mesmo sendo beneficiadas do ponto de vista da dívida, perdem competitividade ante as concorrentes estrangeiras.

Outro lado da moeda

Real valorizado permite maior endividamento das companhias.

A desvalorização do dólar, que causa preocupação em governantes de todo o mundo, tem efeito positivo no nível de endividamento das companhias abertas brasileiras.

Ao observar uma amostra de 114 empresas não financeiras sem Petrobras e Vale, a Ativa Correta observou que a relação entre a dívida líquida e o lucro antes de juros impostos, depreciação e amortização (lajida) caiu de 1,2 vez para 1,1 vez entre o primeiro e o segundo trimestres deste ano, mesmo com a dívida bruta tendo aumentado 6%, para R$ 332 bilhões.

A explicação do nível comportado dessa medida de endividamento nos últimos trimestres, segundo a corretora, está relacionada tanto com a alta do lajida quanto com a queda do dólar. Em outras palavras, se o real não tivesse se valorizado, as companhias pareceriam mais alavancadas.

A conclusão de levantamento feito pelo Valor Data com 237 empresas não financeiras, desta vez considerando Petrobras e Vale, é semelhante. Em 12 meses até junho, a dívida bruta desse grupo subiu 26,4%, para R$ 549,8 bilhões. Apesar disso, a relação desse passivo financeiro com o patrimônio líquido subiu apenas de 64,3% para 68,8%. As companhias estão se endividando para financiar investimentos e aproveitar o aquecimento da economia.

Ao se observar os dados por trimestre, nota-se que o resultado financeiro das companhias, que capta o efeito da variação cambial na dívida, teve seus melhores períodos no segundo e terceiro trimestres de 2009, quando o dólar caiu 15,3% e 9,8%, respectivamente, portanto recuos superiores ao deste ano (ver quadro acima).

Esse tipo de variação tem impacto direto no lucro das companhias, o que deve se repetir no terceiro trimestre deste ano, quando a moeda americana perdeu 6,2% ante o real de junho.

No caso dos balanços de celulose e papel, há ganho na linha financeira, sendo que os resultados e margens operacionais não serão tão pressionados por essa variação, uma vez que as cotações internacionais da celulose estão acima da média histórica.

Dessa forma, a última linha do balanço das empresas do setor deverá refletir ganhos financeiros advindos da variação cambial, embora menores do que os registrados no terceiro trimestre do ano passado, e também melhora operacional, especialmente na comparação com aquele intervalo. Além da Fibria, Suzano Papel e Celulose e Klabin se encaixam nesse cenário.

A Suzano, cuja dívida bruta totalizava R$ 6,29 bilhões em 30 de junho (quase 50% em moeda estrangeira), tem mais de 50% de suas receitas geradas no mercado externo, com destaque para a celulose. A Klabin, por sua vez, não vende a matéria-prima, que é cotada em dólar (toda a celulose que produz é utilizada na fabricação de papéis), e exportou, no primeiro semestre, o equivalente a 34% de suas vendas em volume.

"A Klabin acaba menos exposta que as demais na linha da receita e ainda há o impacto positivo do câmbio no financeiro", diz o analista Leonardo Alves, da Link Investimentos. Em 30 de junho, a dívida bruta da companhia, maior fabricante nacional de papéis para embalagens, era de R$ 4,71 bilhões, 60% em moeda estrangeira.

Nos setores de mineração e siderurgia, em que as empresas têm parte relevante da dívida em dólar, também haverá impacto da variação cambial. No caso da Vale, mesmo na receita o dólar não terá efeito tão negativo, por conta do preço maior do minério. Já entre as siderúrgicas, isso não ocorre.

O analista Rodrigo Ferraz, da Brascan Corretora, destaca o fato de que a queda do dólar está levando as siderúrgicas brasileiras a sofrer uma concorrência estrangeira feroz. Os estoques de aço se acumulam nos distribuidores e as usinas, a partir de setembro, passaram a dar descontos na faixa de 10% para no mercado doméstico. Ferraz calcula que, neste ano, o aço importado vai participar com 20% do consumo do produto no Brasil contra 5% a 6% em anos anteriores.

Outro fator que poderá derrubar os ganhos das usinas locais este ano é o rearranjo que a China está fazendo em seu parque siderúrgico para conter a inflação e reduzir o consumo de energia. O fato está levando os chineses a exportar aço. Nos nove primeiros meses do ano, as exportações chinesas de aço cresceram 116% ante 2009, destaca Ferraz, da Brascan.

Nesse contexto, o analista Marcelo Aguiar, do Goldman Sachs, projeta uma redução do lucro das usinas brasileiras na faixa de 6% neste ano, ante 2009. Ele tem um cenário de cautela para as siderúrgicas e projeta mudanças não apenas no preço do aço doméstico como também na estrutura industrial do setor, com foco na produção de aço especializado e na tendência de consolidação.

"Na média, o efeito do câmbio para as siderúrgicas é negativo", diz Felipe Reis, analista de mineração e siderurgia do Santander.

No quarto trimestre, com uma baixa de 12% no preço do minério e dólar a R$ 1,66, Reis diz que também a Vale terá perda operacional.

Fonte: Valor Econômico

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