O Brasil se tornou o primeiro país do mundo a adotar oficialmente as normas globais de reporte de dados ESG (sigla em inglês para meio ambiente, social e governança) na última sexta-feira, 20, após a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) editar uma resolução que avaliza as normas do International Financial Reporting Standards (IFRS).
As normas, lançadas globalmente em junho deste ano, cria padrões para o reporte de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade para empresas e fundos de investimento, obrigando as empresas de capital aberto, listadas na B3, a publicar, a partir de 2026, relatório especial com informações financeiras relacionadas à sustentabilidade. A medida está inserida no plano de transformação ecológica, como é chamado oficialmente a agenda verde do governo.
Os relatórios deverão ser apresentados anualmente, sempre em maio, junto ao formulário de referência, sendo que no ano que vem e em 2025 a sua publicação será voluntária. Com possíveis ajustes após a realização de consulta pública, a regra tem como objetivo ajudar investidores a tomar decisões alinhadas a critérios sustentáveis a partir da divulgação, de forma mais transparente, de oportunidades e riscos relacionados aos negócios de cada empresa.
Durante a apresentação da resolução da CVM no gabinete da Fazenda em São Paulo, o ministro Fernando Haddad destacou que a regra visa colocar o Brasil na dianteira “do que há de mais moderno no mundo” para atrair investimentos. O Brasil, frisou o ministro, foi o primeiro país a aderir a essas normas sustentáveis de contabilidade.
Ele aproveitou para elencar os avanços do governo na agenda verde, como a aprovação do mercado regulado de carbono no Senado e o início da consulta pública da taxonomia sustentável. Além disso, acrescentou, termina hoje a consulta pública das regras de contabilidade do novo mercado, com publicação prevista para breve.
Haddad disse que não seria razoável obrigar agora, perto do fim do ano, a divulgação dos relatórios de sustentabilidade de forma imediata. Por isso, haverá um período de adaptação, no qual a publicação não será obrigatória.
O ministro afirmou que para exportar, por exemplo, para Europa, onde as exigências de práticas sustentáveis são mais rígidas, o Brasil precisa ter boa governança interna. Segundo ele, quanto mais o País demonstrar compromisso ambiental ao mundo, mais os produtos brasileiros serão aceitos no exterior.
Qual o impacto do lançamento do IFRS?
Antes das normativas de caráter global, as companhias adotavam diferentes formas para a divulgação de relatórios de sustentabilidade — cada empresa reportava as informações que julgava importantes, criando uma dificuldade na hora de comparar empresas ou quantificar o avanço da agenda.
Agora, a ideia é que seja possível comparar os mesmos dados e indicadores de diferentes empresas que atuam no mesmo setor, graças à criação de métricas quantitativas para o mercado de ESG. Com isso, os objetivos de sustentabilidade traçados pela empresa que tenham impacto financeiro precisam ser justificados no reporte financeiro.
Segundo especialistas, com a mudança, haveria o combate ao greenwashing (“lavagem verde”, em inglês), quando há falsas ações de sustentabilidade, que historicamente já aconteceram em relatórios de ESG justamente por não haver um padrão a ser seguido ou balizadores que norteassem os documentos, o que enfraquece a governança corporativa das empresas como consequência.
Vale destacar que a preocupação com as normativas era uma demanda também das entidades internacionais. A IOSCO, que se tornou o principal fórum internacional para as autoridades reguladoras dos mercados de valores, já havia mencionado a necessidade de uma padronização para esse mercado.
“Na época, a IOSCO, inclusive, afirmou que, se houvesse o lançamento pelo ISSB, eles iam endossar e referendar as normas. O que foi feito rapidamente, inclusive, incentivando que todas as ‘CVMs’ do mundo sugerissem as normas para as empresas de seus países”, afirma sócia da EY Brasil na área de sustentabilidade e mudanças climáticas, Ana Luci Grizzi.
Embora a CVM tenha coordenado o referenciamento, como já era esperado pelo mercado, algumas empresas especulam que o Banco Central (BC) possa também referendar as normativas, o que faria com que não só empresas de capital aberto fizessem a adesão das normas, mas também os bancos e cooperativas.