Trinta e uma empresas se candidataram para participar do projeto-piloto do Confia, da Receita Federal, que tem por objetivo estimular uma relação cooperativa entre fisco e contribuintes. Nem todas farão parte da iniciativa, porém deve ser superado o número de 15 companhias previsto originalmente pela legislação para composição inicial do programa.
Voltado a grandes empresas, o Programa de Conformidade Cooperativa (Confia) estabelece uma relação mais próxima entre Receita e contribuintes, que poderão, por exemplo, abrir o seus planejamentos tributários ao fisco e questionar se a tributação está de acordo. Caso a companhia participante opte por prosseguir com a operação e seja autuada, ela pode se livrar de multas aplicadas pela Receita.
A continuidade do programa, porém, esbarra na aprovação, pelo Congresso, do PL 15/24 ou de outro projeto que o institua. Sem a passagem pelo Legislativo, o Confia não sairá da fase piloto para se tornar uma iniciativa permanente.
O piloto do Confia foi instituído no começo de abril pela Portaria RFB 402/2024. A norma prevê a seleção de 15 contribuintes com faturamento acima de R$ 2 bilhões anuais, porém, segundo Flávio Vilela Campos, auditor fiscal da Receita e coordenador do Confia, o número deve ser superado. Isso porque todas as companhias validadas por terem capacidade de participação devem ser selecionadas.
O próximo passo, segundo Campos, é construir um plano de trabalho com cada companhia selecionada, o que deverá ser concluído entre 60 e 90 dias. “Os temas a serem trabalhados, que chamamos de questões fiscais, podem ser algo que a própria empresa fala ‘eu quero trabalhar’, como um planejamento tributário ou uma dúvida que ela tenha. No âmbito da Receita são questões que provavelmente iriam ser fiscalizadas, que o trabalho normal seria abrir uma fiscalização, e se fosse confirmada a inconsistência seria feito um lançamento com uma multa mínima de 75%”, diz o auditor.
Outro exemplo de tema que pode ser trabalhado no âmbito do Confia, segundo Campos, é o preço de transferência. Isso porque o modelo atual, baseado no princípio arm’s length, exige que os contribuintes tomem como base operações praticadas por empresas não relacionadas para calcular o IRPJ e a CSLL em operações internacionais entre partes ligadas. A sistemática é muito mais complexa se comparada à anterior, e, por isso, segundo especialistas, a interlocução com a Receita é fundamental.
O coordenador do Confia diz que os contribuintes participantes do programa não serão divulgados, e que as empresas que se candidataram ao piloto têm perfis distintos: de companhias com pouco mais de R$ 2 bilhões de faturamento às maiores empresas do Brasil. “[O participante do Confia] é aquele contribuinte que já tem toda uma estrutura de governança, de como apurar o tributo, de como ter os controles internos para apuração dos tributos”, afirma.
Campos salienta que o objetivo do programa não é o incremento arrecadatório, mas que isso pode vir a longo prazo. Ainda, defende que, com o Confia, a judicialização deixará de ser a única alternativa para a resolução de conflitos. “O fisco está trabalhando [no programa Confia] para melhorar principalmente esse relacionamento [com o contribuinte], e com isso melhorar a higidez do sistema. Eu reduzo litígios, conheço as principais disputas, tenho um ambiente para conversar com o contribuinte”, diz.
A continuidade do Confia, entretanto, está atrelada à aprovação, no Congresso, de algum projeto que o institua. No começo do ano a Receita chegou a enviar ao Legislativo o PL 15/24, que regulamentava o Confia e outros dois programas de conformidade: o Sintonia e o Operador Econômico Autorizado (OEA).
A proposta, entretanto, travou no Congresso por tratar, além desses pontos, da definição de devedor contumaz. O assunto chegou a ser retirado do PL, permanecendo apenas o tema dos programas de conformidade, mas atualmente a proposta está parada.
Sem uma lei, o Confia não se sustenta por prever, por exemplo, redução de multas. O tema, assim, não pode ser tratado por instrumentos como instrução normativa.