Por Hamilton Carvalho

Costumo dizer que o ser humano faz sempre 2 julgamentos automáticos o tempo todo: o de justiça e o de coerência (alheia, é claro). Hoje vou tratar apenas do 1º deles e em um contexto fortemente emocional.

Provavelmente poucas coisas disparam mais esse alarme automático da (in)justiça do que a forma como os tributos são administrados no Brasil.

A carga é excessiva, há meias-entradas tributárias para setores com acesso a canais de poder e o retorno social é baixíssimo, pois o Estado brasileiro é, na prática, uma máquina perversa de concentração de renda.

A sonegação é outra fonte de injustiças nesse contexto porque distorce a concorrência, punindo quem quer trabalhar direito com um fardo mais pesado.

De forma não surpreendente, trata-se de um fenômeno complexo, mas que é tratado de forma fragmentada pelo Estado brasileiro. Em vez de gerir a feijoada de forma conjunta, órgãos de administração tributária, procuradorias e polícias cuidam cada qual de sua parte do porco e no seu próprio e descoordenado ritmo.

Sabendo disso e contando com a lentidão do Judiciário, quadrilhas montam esquemas sofisticados, que chegam a envolver dezenas de empresas em nomes de laranjas e até mesmo offshores.

A sonegação, porém, ocorre em graus. Há empresas, por exemplo, que só sobrevivem no mercado sonegando todos os tributos que conseguem, explorando parcelamentos especiais e todas as brechas que existem em um sistema mal desenhado.

Há, ainda, uma 3ª categoria, mais benigna (que, tecnicamente, nem é considerada sonegação) –aquela em que a falta de pagamento de tributos ocorre por erro, por dificuldades com a legislação ou pela exploração de brechas que parecem legítimas.

AGENDA DE 7 PONTOS

Considerando o estado pré-falimentar de vários governos no Brasil, está na hora de lidar com o fenômeno de maneira sistêmica.

Primeiro, é preciso medir o chamado gap tributário, que, grosso modo, é a diferença entre a arrecadação potencial e a real. Na Grã-Bretanha, por exemplo, que é uma referência nessa área, a diferença gira em torno de 6%.

O cálculo não é trivial, mas é necessário. Hoje, não se conhece a eficácia dos órgãos tributários brasileiros, que atuam frequentemente sob pesada inércia. É um voo cego.

Segundo, é preciso criar uma agência especializada em fraudes estruturadas ou, na pior das hipóteses, uma força-tarefa permanente, reunindo todos os órgãos de Estado que atuam sobre o problema: fisco, procuradoria, ministério público e polícia civil.

Provar esquemas fraudulentos e atuar com agilidade nas atuais estruturas é difícil.

Faltam competências estratégicas, capazes de lidar com a complexidade do fenômeno. Por exemplo, geralmente apenas uma pequena fração dos esquemas responde pela maior parte da sonegação.

Terceiro, e esse é um ponto que não pode deixar de ser enfatizado, é preciso simplificar absurdamente a legislação tributária e suas obrigações bizantinas –aquilo que os economistas comportamentais têm chamado de sludge. O país clama por uma revolução que coloque a experiência do cidadão, e não a burocracia burra do poder público, no comando do jogo.

Ainda nessa linha, no campo de sistemas complexos sabe-se que a pior maneira de uma organização lidar com a complexidade em que está inserida é tentar controlá-la. O que significa, em termos práticos, que não se combate sonegação tornando a legislação tributária um inferno, porque isso cria ainda mais brechas para agentes mal-intencionados. Simplificação é tudo aqui.

Quarto, é preciso segmentar os contribuintes por risco, como fazem há décadas os países da OCDE –algo que no país mal se arranha.  Isso implica tratar desigualmente os desiguais, criando um ambiente de efetiva confiança. Gosto muito do princípio de confiar desconfiando, o que o ex-presidente americano Ronald Reagan popularizou como trust but verify.

O 5º passo é a eliminação progressiva de benefícios fiscais e outras condições especiais, que não apenas criam a indesejável sensação de injustiça, mas também levam à busca frenética e sem fim por meias-entradas daqueles que não são contemplados por esses tipos de benesse.

Em 6º lugar, é preciso agir sobre as alavancas corretas do sistema. Por exemplo, não se combate sonegação de tributos que incidem em combustíveis fiscalizando postos, mas sim atuando sobre distribuidoras e formuladoras ilegais de combustível adulterado.

Finalmente, é preciso atuar no mercado de ideias. A ideia de que todo imposto é roubo, vendida por alguns “economistas” de Facebook, acaba servindo de muleta ideológica para legitimar um comportamento (sonegação) que é, em rigor, um crime.

https://www.poder360.com.br/opiniao/economia/nao-pergunte-a-um-economista-de-facebook-como-combater-a-sonegacao-diz-hamilton-carvalho/

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