Fim de RTT e alteração de ágio podem ficar para 2014

Por Fernando Torres | De São Paulo

 

O fim do Regime Tributário de Transição (RTT) e as mudanças na dedutibilidade fiscal do ágio gerado em aquisições devem ficar apenas para 2014, e não mais para o ano que vem, segundo comunicado divulgado pela Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca) a suas associadas.

Conforme a Abrasca, que narra uma reunião de diversas entidades empresariais com técnicos da Receita, no dia 9 de novembro, o órgão arrecadador teria reconhecido a "inviabilidade do prazo para vigência da Medida Provisória em 2013, posto que há ainda todo um processo de encaminhamento legislativo a ser seguido".

Essa MP, aguardada com ansiedade pelo mercado, encerra o RTT e também altera algumas regras sobre o ágio fiscal. Minuta da Medida Provisória que circulou no mercado e foi divulgada pelo Valor no início de setembro prevê que o ágio só poderá ser amortizado - reduzindo o imposto a pagar - após um período de carência de quatro anos a partir da aquisição, e não mais imediatamente após a incorporação da empresa adquirida. O texto dizia também que o ágio fiscal seguirá a mesma regra de cálculo usada para fins societários - deixando de ser a simples diferença entre o preço pago numa aquisição e o patrimônio contábil da empresa adquirida.

Conforme relato da Abrasca, a Receita deve finalizar o texto da MP este ano, mas não haveria tempo para que passasse pelos órgãos internos do governo até sua publicação, bem como para adaptação das empresas já em 2013. Como a regras mudam a cobrança de Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL), dependendo da data da edição da MP e de sua conversão em lei, poderia haver questionamentos legais sobre a data em que as alterações produziriam efeitos.

O Fisco também teria aceitado o pleito das empresas de fazer alterações nas multas que pretende cobrar por erro no preenchimento do e-Lalur, versão eletrônica do livro de apuração do lucro real, obrigatório após o fim do RTT. A ideia era cobrar percentuais sobre o faturamento das empresas, o que deve ser revisto.

A Receita foi procurada ontem para confirmar a informação, mas não retornou até o fechamento da edição. No fim de outubro, em resposta a uma demanda sobre o mesmo tema, o Fisco disse que não comentaria o assunto.

Sem uma confirmação oficial de Brasília sobre as regras do jogo no ano que vem, algumas empresas preferem não esperar para ver.

Em comunicado divulgado hoje, a Amil informou que seu conselho de administração se reunirá em breve para analisar a operação de incorporação da Mind Solutions, sua nova controladora, pertencente ao grupo UnitedHealth, para que possa ser dado início à amortização fiscal do ágio decorrente da aquisição do controle da companhia.

No dia 12, a BRF informou que fará a incorporação das controladas Sadia e Heloísa. No caso da Sadia, há um ágio de R$ 3,59 bilhões fundamentado na expectativa de rentabilidade futura, que permite o benefício fiscal. Para a Heloísa, o valor é de R$ 33 milhões. Segundo a companhia, o montante será usados para fins fiscais, em dez anos, nos termos da legislação vigente.

Segundo a BRF, a incorporação será feita para a redução de custos e captura de sinergias. A operação com a Sadia não poderia ter ocorrido antes da aprovação do negócio pelo Cade.

 
Fonte: Valor Econômico
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Comentários

  • Receita deve alterar regras para ágio em aquisições

    Por Bárbara Mengardo, Adriana Aguiar, Laura Ignacio e Fernando Torres | De São Paulo

    Tudo indica que o esforço dos contribuintes para conseguir manter o benefício fiscal da amortização de ágio gerado em aquisição surtiu resultado. O texto de uma minuta da medida provisória que determinaria o fim do Regime Tributário de Transição (RTT), a qual o Valor teve acesso, traz novas regras, restringindo o uso do benefício, que reduz o Imposto de Renda (IR) e a CSLL a pagar.

    A Receita Federal queria simplesmente acabar com o ágio, que tem gerado inúmeros casos de autuações bilionárias. Mas após negociações entre empresários e governo, essa solução intermediária é a que tem mais chances de prosperar.

    De acordo com o Subsecretário de Tributação e Contencioso da Receita, Sandro de Vargas Serpa, a proposta de MP seria encaminhada à presidente Dilma Rousseff até sexta-feira. Serpa admite, entretanto, que o prazo poderá ser estendido, já que depende da agenda da Fazenda.

    Antes da publicação, detalhes finais ainda seriam debatidos. "Esse projeto foi feito no âmbito da Receita Federal, e logicamente colhemos impressões, tivemos contato com alguns tributaristas de forma informal. Agora que a minuta está pronta, o Ministério da Fazenda chamará alguns institutos e federações para conversar em cima de algo mais concreto", disse Serpa, em um evento na semana passada.

    Há certa urgência para a publicação da MP, já que alguns prazos devem ser cumpridos para que as normas entrem em vigor a partir do início de 2013. Com base na Constituição, a medida provisória deve ser publicada até o fim deste ano para ter efeitos em relação às mudanças no IR. Já em relação às contribuições, as alterações passam a ter efeitos práticos após 90 dias a contar da sua edição. Porém, a Constituição também estabelece que a MP deverá ser convertida em lei ainda neste ano para valer em 2013, caso majore o IR a pagar.

    Com eleições e o julgamento do mensalão, especialistas acreditam que é improvável que isso seja possível. "O que pode acontecer é que o governo diga que não se trata de uma majoração, como aumento de alíquota ou da base de cálculo", diz o advogado Luiz Rogério Sawaya Batista, do escritório Nunes e Sawaya Advogados.

    Conforme o texto, a dedutibilidade fiscal do ágio será proibida em operações dentro do mesmo grupo econômico. Outra mudança tem relação com o cálculo do ágio em si. Até 2007, ele era obtido pela diferença entre o preço pago e o patrimônio líquido contábil da empresa adquirida. Agora, fica claro que ele será composto pela diferença entre o preço de aquisição e o valor justo dos ativos líquidos comprados. "Com isso, o valor do ágio vai diminuir", afirma Sawaya. Quanto menor o ágio, menor o benefício fiscal.

    Outra mudança, que ainda não estaria totalmente definida, tem relação com o prazo. Hoje o ágio é amortizado num intervalo de cinco a dez anos, a partir do momento da incorporação da empresa adquirida. Mas, na prática, quase todas as empresas usam o prazo mais curto.

    Pelo texto da minuta, a amortização só começaria a ocorrer a partir do quarto ano da aquisição, também por um mínimo de cinco anos dali em diante. Com a dilatação do prazo para nove anos, o valor presente do benefício fiscal será menor.

    Esse prazo de quatro anos para início da dedução foi considerado muito longo por Pedro Cesar da Silva, da ASPR Auditoria e Consultoria. "Evidentemente que o setor empresarial deverá tentar reduzir isso no Congresso", diz. Por outro lado, Silva diz que a solução "foi um alento para o setor empresarial", se for levado em conta que o Fisco queria acabar totalmente com o benefício.

    O presidente da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca), Antonio Castro, diz que o órgão não foi procurado formalmente pela Fazenda para discutir a minuta. Mas adianta que vê com preocupação a mudança no prazo para amortização do ágio. "Nesse momento, vemos com preocupação medidas que possam ser inibidoras de aquisições, porque o benefício, nesse caso, estaria sendo mandado para o futuro", afirma.

    O rigor na fiscalização de operações que gerem ágio também deve ficar maior caso essa minuta seja aprovada, segundo Silva. Isso porque o texto prevê que os laudos usados na incorporação deverão ser registrados em cartório, o que não era exigido até então. Além disso, deve haver uma aceleração nos processos de incorporação que estão em curso. Isso porque o texto prevê que as incorporações feitas até 31 de dezembro de 2012 seguirão as regras já existentes.

    Para Eduardo Kiralyhegy, do Negreiro, Medeiros & Kiralyhegy Advogados, a mudança no ágio deve dar fôlego à arrecadação e ao mesmo tempo inibir as operações de incorporações. "Virou uma febre fazer operação societária como forma de planejamento fiscal e ter um ganho imediato", diz. Por essa nova maneira proposta na minuta, essas incorporações terão que ser consideradas na sua essência e pensando na sua continuidade, de acordo com Kiralyhegy.

    Além da questão do ágio, a MP traz todas as regras que deverão ser seguidas para apuração do lucro real, com o fim do RTT. Segundo Kiralyhegy, a minuta preserva a neutralidade fiscal. Mas em vez de se fazer os ajustes em uma declaração separada (Fcont), como ocorreu entre 2008 e 2012, passa-se a fazer agora no e-Lalur. "É uma saída razoável porque não se criou uma nova regra. Não deve elevar a carga tributária."

    Além do fim do RTT, a MP traz uma definição de "receita bruta", que é base para incidência de tributos como PIS, Cofins e contribuição previdenciária. Além da receita de venda de bens e serviços, o texto considera como faturamento "as receitas da atividade ou objetivo principal da pessoa jurídica", que não sejam de vendas de bens e serviços.

    Para Sawaya, o novo texto não afeta a discussão, em andamento no Judiciário, sobre o que entra na base de cálculo do PIS e da Cofins para as instituições financeiras. "Mas o novo conceito aumenta a base de cálculo das empresas que recolhem o PIS e a Cofins cumulativos pelo regime do lucro presumido", afirma.

    A Receita tentou incluir um conceito de receita bruta mais amplo na Lei 12.715, mas a definição foi vetada pela presidente Dilma após reclamação de empresários, para que houvesse uma discussão mais profunda sobre o tema. Na versão vetada, seria considerado receita bruta "o ingresso de qualquer outra natureza auferido pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou de sua classificação contábil, sendo também irrelevante o tipo de atividade exercida pela pessoa jurídica".

    Um assunto da minuta que ainda gera mais controvérsia entre o Fisco e as empresas é a tributação de aquisições com deságio, ou seja, quando ocorre o que os técnicos chamam de compra vantajosa. Nesse tipo de transação, o preço pago pelo comprador é inferior ao valor atualizado dos ativos líquidos recebidos.

    Pela contabilidade societária, quando isso ocorre a empresa compradora deve registrar um lucro, correspondente a essa diferença, de uma única vez. A Receita entende que se aquele lucro servirá como base de pagamento de dividendos, a tributação de todo esse ganho deve ocorrer também de uma única vez.

    Mas como esse é um lucro não realizado do ponto de vista de caixa, as empresas tentam convencer o Fisco de que a tributação desse ganho na compra vantajosa ocorra conforme os ativos adquiridos sejam vendidos ou baixados. "Apesar dessas operações serem mais difíceis de ocorrer, deve trazer um impacto financeiro grande para as companhias que fizerem essa operação", diz Silva, da ASPR.


    Fonte: Valor Econômico

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