DT-e e MDF-e - I Had a Dream

Por Álvaro Antônio da S. Bahia

Neste mês de maio de 2021, em plena pandemia do Coronavírus, condição que nos proporciona um cenário desafiador, com muitas incertezas e grandes dificuldades, eu tive um sonho! Aliás, foram muitos sonhos em uma mesma noite!
  
Sonhei que no dia 5 de maio do ano de 2005, em Salvador/BA, na minha terra natal, eu estava presente em uma reunião onde as equipes técnicas das Sefaz BA, PE, RN, SC, SP, RS, ENCAT1 e Receita Federal do Brasil (RFB), se reuniram para discutir o início da modelagem de um Projeto
Básico para instituição da NF-e no Brasil, sendo que, já em agosto deste mesmo ano, tínhamos encaminhado uma proposta para os secretários de fazenda dos estados e da RFB aprovarem e assinaram o Protocolo ENAT 03/20052, objetivando a implantação da NF-e, projeto integrante do Sistema Público de Escrituração Digital – SPED.
  

Sonhei que no dia 22 de janeiro do ano de 2007 tivemos a publicação do Decreto nº 6.022/20073, que instituiu o Sistema Público de Escrituração Digital, sendo este atualizado pelo Decreto nº 7.979 de 8 de abril do ano de 2013, onde foi inserido ao Art. 3º do Decreto 6.022 o inciso III, permitindo
que os órgãos e as entidades da administração pública federal direta e indireta que tenham atribuição legal de regulação, normatização, controle e fiscalização dos empresários e das pessoas jurídicas, pudessem utilizar as informações do SPED, com o objetivo de se evitar as exigências de
declarações e documentos concorrentes e paralelos, entre os órgãos de governo, que venham a aumentar os custos e obrigações das empresas.
  

Sonhei que a partir dessa exitosa experiência da NF-e e do inédito exemplo de cooperação fiscal envolvendo os contribuintes, as Administrações Tributárias Estaduais e Federal, além de diversos órgãos de controle do governo, desenvolvemos e implantamos o MDF-e, Manifesto Eletrônico de
Documentos Fiscais, instituído a partir do Ajuste SINIEF 21/20104, além de todo um Ecossistema de Documentos Fiscais Eletrônicos e eventos que operam de forma integrada com as cadeias de suprimentos e logística de todas as empresas que transacionam com mercadorias e transportam
cargas, em todos os tipos de modais.
  
Sonhei que a partir do ano de 2015 já tínhamos quase todos esses documentos emitidos em formato 100% digital, o que possibilitou o lançamento do Projeto Canal Verde Brasil-Id, projeto do ENCAT instituído a partir do Protocolo ICMS 51/20155, que possibilitou a redução do tempo de
parada de veículos de cargas nos postos fiscais, a partir da automação dos nossos processos de apuração e controle do ICMS acompanhados pelas áreas de fiscalização de mercadorias em trânsito das Sefaz e nossas Centrais de Operações Estaduais (COE).
  
Sonhei que esta capacidade de realizar cálculos informatizados, trazida pelos documentos eletrônicos de mercadorias e transportes, possibilitou a automação da apuração dos impostos por item de produto descritos em cada linha da NF-e, além da identificação do momento da saída do veículo de carga na transportadora da UF de origem, UFs de percurso, até a UF destino, o que nos levou ao lançamento do conceito de “Inspeção de Veículos de Cargas em Movimento e Canal Verde Sefaz, processo que foi instituído na Sefaz/BA a partir da Portaria nº 290/20156, publicada no Diário
Oficial do Estado no dia 06 de outubro do citado ano, o que eliminou a necessidade de repetidas paradas em nossos postos e a completa aposentadoria do uso de carimbos.
  
Ainda no ano de 2015, sonhei que a partir da consolidação do Operador Nacional dos Estados (ONE), desenvolvido pela Sefaz do Rio Grande do Sul em parceria com o ENCAT, seria possível realizar os registros de passagens e rastreamento de veículos de cargas e mercadorias a partir de antenas, câmeras OCR, Praças de Pedágios, sejam estes artefatos instaladas pela ANTT, Prefeituras, Polícia Militar, SEFAZ ou operadores de rodovias concedidas, sendo esses registros de passagens repercutidos em todos os documentos de mercadorias e transportes, além de compartilhados com
as empresas vendedoras das mercadorias, destinatárias, despachantes ou qualquer participantes envolvido na operações, em tempo real, com segurança e respeito ao Sigilo Fiscal e comercial.

Sonhei que no ano anterior, em 2014, trabalhamos na concepção, conjuntamente com os colegas 
da RFB que atuavam na área aduaneira, das especificações e implantação do Programa do Projeto do Portal Único do Comércio Exterior, de forma a integrar os documentos fiscais eletrônicos de exportação aos processos de geração de documentos e processos que envolvem o comércio exterior, a partir do conceito de Guichê Único para os atores intervenientes deste tipo de operação.
Sonhei que, preocupados com a complexidade da emissão de DF-e de transportes e mercadorias por parte de pequenos transportadores autônomos e produtores primários da agricultura familiar, o ENCAT, a Secretaria de Fazenda do Estado do Rio Grande do Sul e o CONFAZ, lançaram o Regime Especial de Emissão da NFF e o APP da Nota Fiscal Fácil (APP NFF disponível para download nas plataformas IOS e Android), que permite a estes contribuintes emitirem seus documentos fiscais
diretamente do seus Smartphones, de forma simples e intuitiva, conforme legislação publicada através da Ajuste SINIEF 37/19, de 13 de dezembro de 20197.
  

Sonhei, também, que as Secretarias de Fazenda tinham lançado desde o ano de 2018 uma Plataforma de Consultas para Antecipações de Recebíveis para DF-e de mercadorias, de forma a permitir uma maior segurança ao segmento financeiro que opera com esta modalidade de crédito
(www.placsvba.ba.gov.br) e que esta plataforma está se integrando com o APP da NFF, para fortalecer os lastros originados a partir do MDF-e e suas respectivas NF-e transportadas.
Com tantos sonhos enfileirados é óbvio que o dia já estava amanhecendo, mas, não é que, subitamente, um barulho vindo da televisão do meu quarto me despertou! E eu, ainda desnorteado e meio que dormindo, vi que a TV estava apresentando uma campanha de lançamento de um Documento de Transporte Eletrônico, chamado de DT-e, de forma quase idêntica a tudo o que eu tinha sonhado.
  

Ainda que muito sonolento, pude identificar que o referido documento de transporte está sendo Implantado através da publicação da Medida Provisória nº 1.051, de 18 de maio de 2021, em substituição ao Projeto de Lei nº 6.093/2019, que está em discussão na Câmara dos Deputados,
local adequado para a ampla discussão de temas complexos com a sociedade e, principalmente, com as empresas que terão que pagar a conta.
 

Comecei a ficar preocupado quando percebi que quase todas as informações e processos que constam no MDF-e, como a geração, emissões, cancelamentos, encerramentos e repercussões através de eventos, eram exatamente iguais a proposta do DT-e. Como poderia ter ocorrido tamanha coincidência?
  

Mas o pior ainda estava por vir, quando percebi que a MP define que o MINFRA pode explorar diretamente ou por meio de concessão ou permissão o serviço de emissão do DT-ev, sugerindo a emissão por instituições privadas que cobrariam do usuário do documento o custo de emissão, segundo já divulgado ao mercado a um custo inicial de R$ 0,68 centavos!
  
Pensei, isso não é real! O MDF-e já faz tudo isso, há muito tempo, além de ser emitido gratuitamente sem a cobrança de tarifas aos seus usuários! Achei que se tratava de efeito da falta de lucidez que normalmente ocorre quando acabamos de acordar, fechei meus olhos e voltei a dormir.

1 ENCAT – Órgão de assessoria do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), reconhecido pelo Protocolo ICMS No. 54/2004 e que tem como objetivo estimular a cooperação fiscal entre as SEFAZ para o desenvolvimento de projetos inovadores, como a NF-e e demais DF-e.
 
  
2 Protocolo ENAT 3/2005 – consulta disponível em: http://www.enat.receita.fazenda.gov.br/ptbr/area_nacional/areas_interesse/foruns/historico/ii-enat/ii-enat-2005-protocolos/protocolo-03-2005-nfe-ii-enat
 

3 Decreto nº 6.022 – consulta disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6022.htm
 

4 Ajuste SINIEF 21/2010 – consulta disponível em:
https://www.confaz.fazenda.gov.br/legislacao/ajustes/2010/AJ_021_10
 

5 Protocolo ICMS 51 – consulta disponível em:
https://www.confaz.fazenda.gov.br/legislacao/protocolos/2015/PT051_15
 

6 Portaria 290/2015 – consulta disponível em:
https://www.sefaz.ba.gov.br/contribuinte/tributacao/portaria_2015_290.pdf
 

7 Ajuste SINIEF 37/19 – consulta disponível em:
https://www.confaz.fazenda.gov.br/legislacao/ajustes/2019/ajuste-sinief-no-37-19
 

(*) Álvaro Antônio da Silva Bahia é Auditor Fiscal da Secretaria da Fazenda do Estado da Bahia.
Coordenador Técnico do Encat e Líder Nacional do Sistema NF-e, tendo atuado em diversos países em projetos de implementação de documentos fiscais eletrônicos, coordenados pelo Centro Interamericano de Administrações Tributárias (CIAT).

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